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Era manhã de
terça-feira. Jellal havia saído do colégio, mal-humorado depois de uma aula de
Sociologia. Detestava aquele tipo de matéria chata, cheia de conversa fiada.
Abriu a geladeira e tirou seus refrigerante e massas, jogando-os no sofá. Tinha
de esperar Erza chegar para que eles ensaiassem a tal peça. Ele havia chamado à
garota - num tom que parecia mais uma ordem - para ir pra casa com ele, mas ela
negara brutalmente, dizendo que iria comer com as amigas e só depois iria para
casa.
– Chegou mais cedo
do que eu esperava - falou ele, ao ouvir o barulho agudo da porta.
– É as meninas tinham coisas pra fazer - ela deu uma olhada nos vários
pacotes em cima do sofá, o que era o almoço de Jellal.
– Você só come
porcaria. Desse jeito, vai ter um infarto antes que possa tentar se apoderar da
Takara. Tome, eu trouxe pra você.
Ela estendeu uma sacola, com uma embalagem de torta de chocolate com
morango. Ele olhou para o conteúdo, com um sorriso torto - Nossa, é porque isso
aqui é tão mais saudável do que o que ia comer...
Eles soltaram uma
risada. Erza se jogou no sofá - Quando você terminar, a gente começa a ensaiar.
– Na verdade,
podemos começar agora. Já comi alguma coisa, nem estou com fome.
Ela observou Jellal,
que havia largado a comida e agora estava concentrado em enrolar algum tipo de
pó num pedaço de seda.
– Cara, você é tão
careta. Por que tem trabalho fazendo uma porcaria dessas?
– Tem noção de
quanto custa um cigarro normal em Londres? A gente tem que se virar.
Ela revirou os
olhos - Mas você não está mais em Londres, lembra? Além disso, essa coisa fede.
Ele fez uma careta
para ela, sem responder.
– Então, como era
lá em Londres? Aconteceu alguma coisa ruim que te fez voltar?
– Hm, lá era...
Normal. Eu gostava. Aqui as pessoas são diferentes, não sei. Digamos que... As
pessoas de lá geralmente eram mais do meu tipo. E eu só voltei por que Haruko
quis que eu ficasse mais próximo da empresa. E você? Por que foi para a Suíça?
Então ele também
sabia que ela tinha ido para a Suíça. Claro que sabia. Aquele garoto
aparentemente tinha investigado a vida dela toda. Sentiu uma pontada de
irritação por estar tão descoberta.
– Ah, sei lá. Eu
estava naquela fase de adolescente rebelde, então acho que a minha mãe ficou de
saco cheio de mim.
Jellal estreitou o
olhar. Não acreditava nela. Primeiro, porque sua voz e postura estavam vagas
demais, segundo, porque aquele não era o estilo de Yuno. Resolveu deixar para
lá. Isso era algo que, inevitavelmente, descobriria depois.
– Ok, então, vamos
começar?
– Hã... Você tem o
seu papel, não tem? Eu acho que perdi o meu - ela falou, meio sem graça.
– Cara, como você é
irresponsável - ele suspirou - Claro que eu tenho.
Erza fez uma careta
de indignação, arrancando o papel das mãos dele.
– Vamos ensaiar
aquela parte que a gente ainda está ruim.
– Qual?
O rapaz revirou os
olhos - Aquela lá que o Harry pede pra casar com a Jane e tal.
– Ah sim, aquela em
que eu dou um fora em você? - ela riu, divertida.
– A Jane dá um fora no Harry.
Eu não tenho nada a ver com isso
– Tá, ok. Pronto?
Jellal levantou-se.
Ajeitou a postura, ficando mais reto. Pegou o script e se pôs a falar, com uma
entonação apática na voz.
– Eu queria te
dizer isso a muito tempo.
Ele se aproximou de
Erza, caminhando firmemente, olhando fixamente em seus olhos. A mão dele chegou
à cintura da garota, contornando-a, pegando-a desprevenida. O atrito de seu
toque com a roupa dela parecia dar choques em seu corpo. Ela ficou daquele
jeito, abobada, olhando para os olhos dele, tão profundos, tão intensos. De
repente, balançou a cabeça para o lado e empurrou-o. Jellal tropeçou. Olhou
para ela indignado.
– O que foi? Nessa
porcaria aqui diz que eu tenho que te "trazer pra perto de mim", você
sabe disso! - ele quase gritava.
Ela estava parada,
a respiração mais pesada que o normal. Olhou para Jellal, que ainda tinha uma expressão
assustada e irritada ao mesmo tempo.
– Me desculpe -
disse ela, olhando para baixo, fazendo esforço para raciocinar - É só que eu
não estou muito bem hoje. Depois... Depois a gente ensaia.
Pegou os livros
apressadamente e começou a subir as escadas, num andar que mais parecia uma
corrida.
– Ei! - Jellal
gritou - A seleção já é amanhã!
– Depois! - ela
respondeu lá de cima, batendo a porta do quarto em seguida.
...
Ela batia o pé no
chão freneticamente, do lado de fora do teatro da escola. Detestava esperar. Gildarts
fizera questão de que só um casal candidato entrasse por vez, queria ficar em
paz e sozinho para analisar cada aluno. Olhou para Jellal, apoiado na outra
parede do corredor, à sua frente. Estava totalmente calmo e relaxado. Como diabos
ele conseguia?
Sua mente
trabalhava repetidamente entre passar todas as falas, todos os movimentos
necessários para peça, e também em, contra a sua vontade, lembrar vergonhosos
momentos da entrevista familiar de ontem, a tal entrevista que sua mãe havia
usado como desculpa para se casar tão depressa.
A porta do teatro
se abriu, fazendo com que ela mudasse o foco das suas atenções. Um casal
acabara de sair da sala de seleção, uma menina que ela lembrava ter visto
andando com Lisanna, o casal saiu discutindo na frente de todo mundo.
– Você que é um
imbecil!
– Você é burra!
Esqueceu mais da metade das falas!
Gildarts apareceu
na porta, olhando um papel.
– Jellal Fernandes
e Erza Scarlet, por favor.
Ela olhou para Jellal,
a fim de compartilhar sua ansiedade com o olhar, mas ele mirava apenas a frente.
– Não acredita em
mim? - perguntava Jellal para Erza, no palco. Agradecia mentalmente por ser a
última fala.
– Em absoluto - Erza
finalizou.
– Ok, ok - Gildarts
bateu palmas, na plateia, fazendo sinal para que eles viessem até ele - Bom, eu
fiquei sabendo que vocês são irmãos, então esse tipo de coisa deve ser difícil
para vocês fazerem juntos. Erza me desculpe por não ter permitido que você
trocasse de par, mas agora vocês estão livres para procurar outra pessoa.
– Não, não - Jellal
gesticulava - Nossos pais apenas se casaram recentemente, mas nós não temos
nenhum laço sanguíneo, não há problema algum.
– Ah, é mesmo? - o
rosto de Gildarts se iluminou - Ótimo, então, porque vocês têm uma química
incrível, são perfeitos juntos. Eu já estava achando uma pena não poder
escolher vocês, sabe, pensei que eram irmãos legítimos. Vocês são meus
escolhidos. Se dediquem bastante a partir de agora, vou entregar o script
completo.
Erza olhou
sorridente para Jellal, com um “EBA” estampado na cara. Ele cruzou os braços e
soltou um leve sorriso de canto, recebendo as várias folhas que lhes eram
entregues.
...
Mais de duas
semanas se passaram. Mira andava alegremente em direção à escola, ao lado de Laxus
e Gray. Era sexta-feira, e ela estava num estado de animação máxima, maquinando
qual seria o plano da vez. Percebeu que Laxus havia passado o tempo todo se
dedicando ao próprio celular, nada passava por despercebido com aqueles olhos
azuis especulativos por perto. Ela ficou por trás de Laxus, apoiando-se nos
ombros dele, tentando ver o que ele fazia com o aparelho.
– Hmm, esta de
conversa com quem dessa vez?
Laxus levantou uma
sobrancelha - Mira, não é nada disso.
– Hah! Eu
du-vi-do!! Ela apontava para ele, sorrindo e tomando sua frente.
Laxus olhou para
ela desanimadamente e soltou um suspiro - Ah, por que mulheres são sempre tão
neuróticas?
Mira e Gray riram,
fazendo Laxus ficar ainda mais desconfortável. A moça avistou Lucy assim que
cruzou o portão do colégio, e soltou um "vejo vocês depois"
apressado. Correu até a outra garota e praticamente pulou em cima dela - Lucy!
Você estava sumida, onde estava se escondendo, hein? Por acaso estava fugindo
da gente?
Lucy tropeçava nas
palavras, tentando responder, mas Mira continuava falando antes de ouvi-la -
Ah, vamos, vem, vamos nos encontrar com os outros porque eu tenho ótimos planos
pra hoje e você vem! Sem papai nem mamãe nem outra desculpa! - Mira puxava Lucy
pela mão até um grupo numeroso de pessoas esparramadas no gramado.
Natsu e Erza
estavam lá. O rapaz estava sentado, e a garota estava deitada no gramado, com a
cabeleira vermelha no colo do garoto, que acariciava os cabelos dela. Lucy ficou
parada. Não estava muito acostumada a conhecer gente nova, nunca tinha trocado
uma só palavra com alguns dali.
Quando viu Lucy chegar,
Erza levantou-se prontamente e abraçou a garota, exibindo mais um de seus belos
sorrisos - Você anda sumida, Lucy, por onde andou?
– Eu só estava...
Estudando.
– Oh, sim, eu
entendo. Mas agora a gente vai prender você, senta aí!
Lucy sentou perto
de Gray, era a pessoa com quem tinha mais intimidade ali. Ficaram conversando
sobre a família, um perguntava sobre o pai do outro e coisas afins, mas a
cabeça de Lucy não estava exatamente ali. Ela só tinha olhos para Natsu e para
a garota ao seu lado. Era verdade o que todos diziam de Erza. Tinha gente que a
odiava, gente que a idolatrava, mas todos concordavam que ela era especial. Ela
tinha uma aura especial, praticamente brilhava. Seu humor era contagiante, sua
beleza era invejável. Lucy não tinha esse brilho. Lucy achava que jamais
alcançaria Erza, e isso a entristecia. Não é como se quisesse roubar Natsu
dela, não, isso nunca. Mas ela desejava que ele pelo menos a olhasse, que ele a
enxergasse através de todo o brilho de Erza.
Lembrou-se daquela
noite. Uma noite de domingo, enquanto eles dois voltavam para casa depois de
ele sair do judô, e ela do balé. A lua cheia banhava o céu tão grande quanto
poderia estar. Lucy falou, para quebrar o silêncio, que adorava a lua. Natsu
respondeu, olhando para o céu, que preferia o sol.
– Por quê? - Lucy
perguntou
– Por que o sol
brilha o tempo todo. A gente pode até não vê-lo, mas ele sempre está brilhando
em alguma parte do mundo. A lua só rouba o brilho do sol, só isso. E assim
também são as pessoas.
– Hã? - Ela não
entendia
– As pessoas
verdadeiras brilham o tempo todo, e esse brilho pertence a elas. Mesmo que em
algumas horas nós não estejamos vendo o brilho delas, elas continuam com ele.
Já as pessoas mentirosas são como a lua. Elas podem até brilhar por um tempo,
podem até mesmo roubar a atenção das pessoas verdadeiras, mas elas não se
iluminam por si só. E a beleza delas sempre acaba. É por isso que eu odeio
mentiras. Um dia, todo o encanto produzindo por elas acaba, e tudo o que sobra
são crateras e feiura.
Lucy gelou. Durante
aquelas semanas todas, eles dois tinham ficado mais próximos. Lucy já sabia
toda a história de Natsu, e Natsu já sabia toda a história de Lucy. Ou, pelo
menos, a história que ela contava para ele. Sempre iam para casa juntos,
conversando sobre si mesmos e coisas aleatórias, e a garota já havia inventado
um namorado imaginário que morava em outro país - separado dela por uma enorme
e cruel distância, mas o amor deles sempre vencia -, uma firma de advocacia da
qual seu pai era dono em Los Angeles e uma paixão de vida inteira pela dança. A
verdade era que não tinha namorado nenhum e seu pai não era dono de firma
alguma, embora fosse um renomado profissional. Tudo o que o rapaz havia acabado
de dizer perfurava seu peito como uma espada, mas como ela poderia explicar
para ele? Como poderia dizer que era justamente por ser alguém sem luz que ela
precisava inventar uma para que ele a enxergasse? Sim, Erza era exatamente como
o sol. Tinha uma luz enorme emanando dela, todos queriam estar perto dela,
todos pareciam precisar dela para esquentar suas vidas. Ela sempre estaria
brilhando em alguma parte do mundo, eles tivessem a sorte de acompanhá-la ou
não. Meninas como Mirajane e Juvia eram estrelas. Também possuíam luz própria,
mesmo que fossem ofuscadas pela luz do sol quando ele estivesse presente. E
ela, Lucy, o que ela era? Apenas um asteroide que vagava por ai no espaço vazio
e solitário, sem luz alguma. Era por isso que ela precisava daquele brilho
também, mesmo que fosse temporário e falso, mesmo que fosse só por algumas
horas, enquanto o sol não roubasse a cena novamente. Mas será que Natsu a
entenderia? Ou será que ele a repudiaria por ter mentido sobre sua vida, por
estar fingindo ser outra pessoa? Lucy se sentia culpada a cada dia, a cada
minuto que via o rapaz, por estar inventando coisas sobre si mesma para ele,
mas não sentia forças para encarar a verdade e arriscar. Por enquanto, ia só
caminhando com o problema, até que chegasse a hora de não conseguir carregar
mais seu peso.
....
– Ei, Erza - Mira
chamava à amiga, que estava prestes a entrar na sua sala de aula - Eu já
combinei com todo mundo de ir naquele clube que você adora hoje à noite, você
vai, né?
– Ah, foi mal, Mira,
mas hoje não vai dar.
A amiga fez uma
cara infantil de irritação - Depois que você começou a namorar o Natsu, não tem
mais tempo para os amigos.
– Oh, não, não,
isso não tem nada a ver com o Natsu. Eu vou ficar estudando.
– Estudando? Nossa
você está tão mal assim em matemática?
– Na verdade, eu
estou bem. Mas eu sou aquela que vai assumir o controle da Takara, e ir pra
festas não vai me ajudar nisso, certo?
– Certo... - Mira
estava meio boquiaberta - Por que você decidiu isso assim, tão repentinamente?
– Eu estive
brincando esse tempo todo, Mira, mas agora é hora de jogar sério. Depois de
conhecer o Jellal, eu vi que tipo de gente eu vou ter que enfrentar. Se eu
continuar sendo a mesma irresponsável de agora, não tenho a mínima chance. Eu
ainda estou muito longe dele, mas isso vai mudar. Eu vou recuperar o tempo
perdido.
Obs: quero agradecer a fofuxa da Jéssica Nunes por sempre notar alguns erros e me falar, beijo pra vc sua fofa =)
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